segunda-feira, 11 de julho de 2011

Criatividade dos Jovens Jogadores

Cada vez mais se constata que o futebol carece de jogadores brilhantes que em momentos de magia levantam os estádios… aqueles que pela sua fantasia, são na generalidade considerados os melhores do mundo, casos de Messi e Cristiano Ronaldo. Mas afinal o que se está a passar? A falta do Futebol de Rua é uma evidência. Outrora as crianças passavam horas dedicadas à modalidade Futebol, nas ruas perto das suas residências. Neste momento, fruto da evolução social, factores como a segurança e ocupação das crianças com actividades escolares e complementares, não permitem que os mais novos, possam passar tanto tempo nestas actividades de lazer, realizadas em liberdade total. Mesmo na escola, que seria o espaço ideal para a prática do futebol de rua, em intervalos e “folgas”, tais actividades não são possíveis. Actualmente, quando um professor falta, os alunos terão que frequentar as aulas de substituição. A responsabilidade de desenvolver as competências que outrora eram desenvolvidas na rua, passaram para os clubes. A rua proporcionava um ambiente altamente favorável ao desenvolvimento de um aspecto que caracteriza os melhores futebolistas, a criatividade. Esta criatividade, prende-se com elevadas capacidades de adaptação às diferentes situações do jogo. Segundo Araujo (2005), os desportistas previsíveis (que sabem antecipadamente o que fazer) não são os que constituem mais perigo nem os que mais problemas causam aos adversários, mas aqueles que criam soluções no momento, os criativos. Estes jogadores, em situações que à partida são consideradas desvantajosas pela maioria das pessoas, conseguem brilhantemente tirar partido delas (ex. um cruzamento em que a bola não segue uma trajectória, em direcção à cabeça do avançado, ele aproveita a situação para realizar um pontapé de bicicleta). A maioria dos jogadores, não procura uma situação deste tipo! Porquê? Porque geralmente, esta adaptabilidade criativa não é estimulada em situações de treino. O que na maioria das vezes acontece, é que o treinador condiciona excessivamente as acções dos jogadores, tão acentuadamente que lhe diz como deve realizar a acção de finalização, pegando no exemplo acima mencionado. Neste sentido, considero que a mecanização de acções no futebol de formação é altamente inibidor do desenvolvimento da criatividade do jovem jogador. Em idades iniciais, é fundamental que o treinador crie problemas, através de situações impostas pelo exercício, e não dê a solução. O jovem jogador deverá inventar as suas próprias soluções, inventar as suas fintas, inventar as suas formas de cruzar, inventar as suas formas de rematar... Penso que é consensual que não houve nenhum treinador que inventou a “virgula” (finta) ou a “trivela” (remate ou cruzamento). Foram sim jogadores, que pela sua criatividade, encontraram/inventaram essas soluções, que dão emoção ao espectador, não só pela beleza estética destas acções mas, porque em simultâneo são altamente eficientes. Neste sentido, devemos dar liberdade aos jovens jogadores, para encontrar a sua forma, altamente personalizada de encarar o jogo. Como se costuma dizer “não dar o peixe, mas ensinar a pescar”. Assim, porque a criança experimentou, percebeu, adaptou-se, teve situações de sucesso e insucesso em determinadas condições, vai saber em que momentos e onde executar as acções por si descobertas, ou seja, vai construir um “saber de experiências feito”.


Recentemente, assisti a um torneio de futebol de formação sub 13, onde à final foram duas equipas representantes dos clubes de maior dimensão a nível nacional. Fiquei surpreendido com a segurança como aquelas equipas encaram o jogo. Muito poucos passes falhados, uma circulação de bola fantástica, variação do centro de jogo, capacidade de tirar a bola de zonas de pressão. A nível defensivo vi duas equipas com alta maturidade na defesa zonal. Foi um futebol tão equilibrado que o resultado final foi 0-0, ausência de golos. Mas o que à primeira vista revela uma maturidade táctica, numa análise mais profunda, pode revelar uma castração da criatividade dos jovens jogadores. O que é certo é que raramente se verificaram duelos 1X1, as chamadas fintas ou dribles. Viu-se um jogo tão mecânico, tão estereotipado, tão seguro, enfim, pequenos robots com comportamentos demasiado previsíveis.

Muito sinceramente, espero que não seja esta uma tendência de treino, que leve a que daqui a alguns anos, o número de estrangeiros a jogar no campeonato português seja ainda maior. Espero que os melhores jogadores do mundo não deixem de ser os portugueses, porque nós lhes retiramos a liberdade de experimentar, a liberdade de errar, a liberdade de ter prazer a jogar futebol, a liberdade de fazer no treino o que para eles é o sonho do jogo.

Artigo Publicado no Jornal Tribuna Desportiva de 5-07-2011

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