Como estimular este tipo de ações!
E isto treina-se?
Muitos exercícios de treino são
tão estanques/invariáveis, que não permitem o desenvolvimento da capacidade de encontrar
este tipo de soluções, para o contexto de jogo.
Os exercícios propostos nas
sessões de treino, devem proporcionar que os jogadores encontrem as respostas
para resolução dos problemas de forma autónoma, sendo condicionados
predominantemente pelas variáveis que constituem os exercícios de treino, e
menos pela obrigatoriedade de realizar certo tipo de ação. Certamente que
nenhum treinador de Ibrahimovic realizou um exercício de treino, em que ele
teria de fazer um pontapé de bicicleta após cabeceamento do guarda-redes
adversário, tal como aconteceu no jogo entre a Inglaterra e a Suécia. Os diferentes exercícios propostos ao longo
do seu percurso desportivo promoveram o desenvolvimento da capacidade de
observar o contexto de jogo e
resolver as problemáticas impostas, com alto nível de rendimento, recorrendo às
ferramentas que tem ao seu dispor. Assim, considere-se o contexto como o adiantamento do
guarda-redes; o fato da bola se direcionar para ele em trajetória aérea; o fato
de ele estar de costas para a balizar; etc.). Considere-se a ferramenta
disponível, o pontapé de bicicleta que utilizou.
Segundo o especialista em Tomada de Decisão,
Duarte Araújo, “os atletas têm a capacidade para expressar soluções únicas, e por isso não
imagináveis pelo treinador…o treinador
diagnostica e organiza atividades de treino, de modo a seletivamente
disponibilizar certas fontes de informação, que orientem o modo como o atleta
se autonomiza na descoberta de soluções para o desconhecido. O treino deve
manipular os constrangimentos relevantes para possibilitar que o atleta fique
afinado à informação contextual que reclama a ação que lhe permite atingir o
objetivo.”
Algumas situações que inibem o desenvolvimento deste tipo de ações!
Muitos exercícios são de tal forma
condicionados, através de instruções dadas pelos treinadores, que quem está a
observar fica com a impressão que os jogadores estão a ser telecomandados, ou
seja, a capacidade de decisão fica descontextualizada pelo excesso de
intervenção do treinador. Nestes casos quem toma maioritariamente as decisões
são os treinadores, e os jogadores passam a meros executantes. Outra situação
que inibe este tipo de ação é quando o exercício é demasiado “fechado”, havendo obrigatoriedade p. ex.
do local para onde é passada a bola, dos locais exatos para onde os jogadores
se devem movimentar, sem haver qualquer tipo de liberdade de ação por parte do
jogador.
Talvez se Ibrahimovic fosse
formatado pela tipologia de abordagem ao treino que referi anteriormente, o que
faria, tal como enunciam alguns livros da especialidade, seria controlar a bola
realizando uma receção orientada e só depois rematar à baliza, o que daria
tempo para o adversário se posicionar, levando a que não conseguisse vantagem
na situação de jogo.
Tomando como exemplo o treino da
receção orientada… hoje em dia, vê-se muitos treinadores, principalmente na
formação, a exigir que os jogadores realizem sempre a tão falada receção
orientada, com determinada parte do pé, para o espaço livre, etc., etc., etc.
Não querendo dizer que esses aspetos não são importantes treinar, mas gostaria
de ressalvar que os melhores jogadores são aqueles que tiram vantagem, em
situações que aparentemente são desvantajosas para os restantes. Para que isto
aconteça no jogo, deve ser treinado/estimulado! A situação em que Ibrahimovic
fez o golo decerto que para 99.9999% dos jogadores de futebol é desvantajosa, mas
ele conseguiu tirar vantagem! Sendo assim, quando um jogador não consegue
realizar a tão famosa receção orientada, não terá de ser sempre alvo de
feedback negativo, devendo-se estimular que tire partido da situação
proporcionada. Se o adversário lhe cria um problema, ele terá de resolver, se
ele cria um problema a si próprio, ele terá de resolver também. Jogadores que
no treino são estimulados para resolver problemas, no jogo resolverão de uma
forma mais rentável.
FRASE DA SEMANA: “Você é
livre para fazer suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências." Pablo Neruda
Artigo
Publicado no Jornal Tribuna Desportiva de 20.11.2012
Um comentário:
Muito bom!
De ressalvar que exercícios fechados e movimentações pré-definidas não são nenhum veneno.
Considero-os como que um passo, uma introdução, um exemplo ao que são as ideias do treinador, principalmente numa fase de primeiro contacto com os princípios que se objectivam. Depois concordo totalmente que se deve permitir e até incentivar à criatividade, à diversidade daquilo que já se adquiriu.
É no fundo uma questão de equilíbrio. Nem treino completamente estandardizado, mecanizado e fechado, nem treino completamente anárquico e "ao Deus dará"...
Cumprimentos!
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