segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Zlatan Ibrahimovic o autor de uma obra de arte:


Como estimular este tipo de ações!

Quando se discute se o jogador Ibrahimovic pode ser considerado o melhor avançado do mundo, a discordância até pode aparecer. Mas o que fez no seu último jogo pela seleção da Suécia, é consensualmente fabuloso! Falo daquele golo de pontapé de bicicleta que fez “do meio da rua”. Este sim, todos serão obrigados a concordar que é uma obra de arte, como referiu o treinador da equipa inglesa Roy Hodgson.

E isto treina-se?

Muitos exercícios de treino são tão estanques/invariáveis, que não permitem o desenvolvimento da capacidade de encontrar este tipo de soluções, para o contexto de jogo.

Os exercícios propostos nas sessões de treino, devem proporcionar que os jogadores encontrem as respostas para resolução dos problemas de forma autónoma, sendo condicionados predominantemente pelas variáveis que constituem os exercícios de treino, e menos pela obrigatoriedade de realizar certo tipo de ação. Certamente que nenhum treinador de Ibrahimovic realizou um exercício de treino, em que ele teria de fazer um pontapé de bicicleta após cabeceamento do guarda-redes adversário, tal como aconteceu no jogo entre a Inglaterra e a Suécia.  Os diferentes exercícios propostos ao longo do seu percurso desportivo promoveram o desenvolvimento da capacidade de observar o contexto de jogo e resolver as problemáticas impostas, com alto nível de rendimento, recorrendo às ferramentas que tem ao seu dispor. Assim, considere-se o contexto como o adiantamento do guarda-redes; o fato da bola se direcionar para ele em trajetória aérea; o fato de ele estar de costas para a balizar; etc.). Considere-se a ferramenta disponível, o pontapé de bicicleta que utilizou.

 Segundo o especialista em Tomada de Decisão, Duarte Araújo, “os atletas têm a capacidade para expressar soluções únicas, e por isso não imagináveis pelo treinador…o treinador diagnostica e organiza atividades de treino, de modo a seletivamente disponibilizar certas fontes de informação, que orientem o modo como o atleta se autonomiza na descoberta de soluções para o desconhecido. O treino deve manipular os constrangimentos relevantes para possibilitar que o atleta fique afinado à informação contextual que reclama a ação que lhe permite atingir o objetivo.”

Algumas situações que inibem o desenvolvimento deste tipo de ações!

Muitos exercícios são de tal forma condicionados, através de instruções dadas pelos treinadores, que quem está a observar fica com a impressão que os jogadores estão a ser telecomandados, ou seja, a capacidade de decisão fica descontextualizada pelo excesso de intervenção do treinador. Nestes casos quem toma maioritariamente as decisões são os treinadores, e os jogadores passam a meros executantes. Outra situação que inibe este tipo de ação é quando o exercício é demasiado “fechado”, havendo obrigatoriedade p. ex. do local para onde é passada a bola, dos locais exatos para onde os jogadores se devem movimentar, sem haver qualquer tipo de liberdade de ação por parte do jogador.

Talvez se Ibrahimovic fosse formatado pela tipologia de abordagem ao treino que referi anteriormente, o que faria, tal como enunciam alguns livros da especialidade, seria controlar a bola realizando uma receção orientada e só depois rematar à baliza, o que daria tempo para o adversário se posicionar, levando a que não conseguisse vantagem na situação de jogo.

Tomando como exemplo o treino da receção orientada… hoje em dia, vê-se muitos treinadores, principalmente na formação, a exigir que os jogadores realizem sempre a tão falada receção orientada, com determinada parte do pé, para o espaço livre, etc., etc., etc. Não querendo dizer que esses aspetos não são importantes treinar, mas gostaria de ressalvar que os melhores jogadores são aqueles que tiram vantagem, em situações que aparentemente são desvantajosas para os restantes. Para que isto aconteça no jogo, deve ser treinado/estimulado! A situação em que Ibrahimovic fez o golo decerto que para 99.9999% dos jogadores de futebol é desvantajosa, mas ele conseguiu tirar vantagem! Sendo assim, quando um jogador não consegue realizar a tão famosa receção orientada, não terá de ser sempre alvo de feedback negativo, devendo-se estimular que tire partido da situação proporcionada. Se o adversário lhe cria um problema, ele terá de resolver, se ele cria um problema a si próprio, ele terá de resolver também. Jogadores que no treino são estimulados para resolver problemas, no jogo resolverão de uma forma mais rentável.

FRASE DA SEMANA: “Você é livre para fazer suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências." Pablo Neruda

Artigo Publicado no Jornal Tribuna Desportiva de 20.11.2012

Um comentário:

Rafael Antunes disse...

Muito bom!

De ressalvar que exercícios fechados e movimentações pré-definidas não são nenhum veneno.
Considero-os como que um passo, uma introdução, um exemplo ao que são as ideias do treinador, principalmente numa fase de primeiro contacto com os princípios que se objectivam. Depois concordo totalmente que se deve permitir e até incentivar à criatividade, à diversidade daquilo que já se adquiriu.

É no fundo uma questão de equilíbrio. Nem treino completamente estandardizado, mecanizado e fechado, nem treino completamente anárquico e "ao Deus dará"...

Cumprimentos!